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MUDAR É PRECISO, NÃO MUDAR É SOFRER

O que representa as mudanças para nós? Quantas são as mudanças que ocorrem a nossa volta. Não apenas as tecnológicas e políticas, mas também todas aquelas que delimitam padrões comportamentais e sociais, hierarquias e até os valores plurais e singulares do ser humano perante a suas relações. A vida é um complexo amplo, repleto de possibilidades que geram imensuráveis e profundas transformações em nossa maneira de ser, de viver e relacionar. As infindáveis transformações que são claramente refletidas em nossos próprios afetos.

Em um mundo contemporâneo cada vez mais impetuoso, as mudanças se tornaram sinônimo não só de liberdade como também de sobrevivência. É necessário estar aberto as mudanças, isto é fato, então, o que nos impede de mudar?

Quando falamos da contemporaneidade estamos referindo a um mundo imediatista, transitório que está em constante movimento. Dentro de um estado efêmero, de um lado infinitos avanços e uma ansiedade enorme de encontrar a própria identidade e a autonomia em viver, ao mesmo tempo que, nesta complexa dialética encontra-se do outro lado, muitas pessoas que se sentem paralisadas diante a tantas transformações.

A contemporaneidade trouxe com suas transformações um novo paradigma comportamental. Muitas mudanças ocorreram na forma de ser e do pensar com a construção continua da pós-modernidade, entre elas, a própria insegurança e a necessidade do reconhecimento identitário. Por causa de tantas mudanças, hoje existe uma dificuldade muito grande em entender nossas próprias relações com o mundo. De nos reconhecer e identificar nosso papel, saber diferenciar como estamos participando nesta complexa obra. Somos o ator principal ou coadjuvante da nossa própria vida! Esta indefinição é a representação máxima da insegurança e do medo de sofrer e que geram um constantemente conflito com nós mesmos e que cada vez mais nos impedem de perceber tantas transformações. Talvez por isto, as mudanças são tão necessárias. Seja na forma de ser, pensar, conviver, trabalhar, em todo e qualquer contexto em que o viver esteja implícito como significado de valor a vida é necessário rever nossas diretrizes para seguir.

A verdade é que para reconhecermos melhor o que representa tantas transformações seja então, necessário, olhar profundamente para o caminho que nos trouxe até aqui. Eis então uma grande dificuldade do ser humano com a pós-contemporaneidade, encontrar sentido nas mudanças que foram ocorrendo ao longo da nossa própria história, ao longo de nosso próprio tempo. Encontrar dentro de nós, quais já foram os desafios e a conquista na qual já alcançamos que nos fez o que somos hoje. Diante a esta difícil introspecção, perceber o que mudou em toda nossa trajetória e o que precisa mudar para continuarmos crescendo com ser.

Através deste exercício introspectivo proposto é aonde somos capazes de perceber que toda as transformações estão relacionadas a uma questão particular de cada um, as nossas crenças. As crenças são nosso alicerce de segurança, as convicções que formam nosso mundo de certezas. As crenças são nosso filtro em um mundo de possibilidades.

Crenças são desconstruídas com as experiências. Quanto mais experiências maior a condição de entender a vida, maior o território de nosso mapa, maior a chance de perceber que estão em nossas certezas o melhor caminho para o erro. Erros no qual muitos deles não temos uma segunda chance de reparar. Convicções nos levam ao fracasso e nos perfaz coadjuvantes da própria vida.

Crenças só são quebradas quando tornamos hábito a condição da liberdade para se viver a própria vida na prática do pensar. Quando deixamos os imperativos e as imposições sociais, propiciando condição para encontrar novos caminhos que faça mais sentido para os instantes presentes que vivemos. Dando novas formas a nossas relações com o mundo, nos tornamos mais perceptíveis com a realidade de tudo que está em nossa volta. Neste momento as verdades se tornam possibilidades que construímos através de uma singular trajetória da nossa própria vida.

Quando damos sentido a nossa trajetória percebemos então as transformações. Neste instante, trazemos para a consciência a certeza que não mudar é renegar a própria existência. Mudanças são escolhas. São elas que representam a imagem de quem realmente somos no presente.

Falar de escolhas é falar do presente e não da nostalgia daquilo que já foi. Transformação. Não somos hoje a pessoa no qual fomos ontem, ou em qualquer outro tempo que não seja o agora. Toda escolha é a representação do que somos e pensamos no exato momento. E aquilo que fez sentido não quer dizer que fará sentido em outro instante. Por que não somos a mesma pessoa, não construímos os mesmos pensamentos e todas as nossas relações com a vida são outras, exclusivamente únicas, muito diferente do que em outros instantes da vida. São as experiências que nos tornam transformadores e que nos constrói. Somos artífices de todas as nossas mudanças. Toda transformação tem sentido que de alguma forma ajuda-nos a construir uma melhor concepção de nós mesmos.

O problema é que nem tudo ocorre da forma que esperamos que ocorra. Nem tudo é resultado conforme esperávamos que fosse, e este desacordo, ou melhor, o não aceitar que em todo o processo de vida há divergências diante as nossas perspectivas é o que torna a vida mais dolorosa e talvez este seja o principal motivo da angustia de mudar. O medo de sofrer!

O medo é um sentimento que carregamos com a vida e o sofrimento é de fato parte da constituição de nossa própria moral. De nossas mais importantes virtudes. Todos os motivos são motivos para sofrer, seja a dor que sentimos pelo outro, pelas alucinações do dia a dia, pela ânsia do viver, por situações inesperadas, momentos indesejados, a perda de alguém, enfim sofremos com o nosso próprio dia a dia em situações das mais diversas e cotidianas. O sofrimento representa toda e qualquer experiência aversiva que é acompanhada de uma emoção negativa. Sofrimento está presente na dor, desprazer, infelicidade, angustia, ansiedade, tristeza, entre tantos outros sentimentos que sempre irão nos acompanhar. O sofrimento é presente.

Até então, fomos capazes de sobreviver ao sofrimento, mas até o sentido do sofrimento se transformou. Talvez esta seja então o principal fator que impede a pessoa de mudar! O medo não está mais nas incertezas, mas nas aparências. A grande característica dos tempos atuais é que temos o dever de ser feliz. Tornou-se uma obrigação, um imperativo social, tornou-se a própria cultura do hedonismo. Em outras palavras é como se o único propósito da vida hoje seja a busca incessante de prazer e que o sofrimento seja uma patologia dos fracassados. A condição contemporânea criou não mais um sujeito da culpa, mas um sujeito narcisista. O bem-estar deixa de ser social e passa a ser individual, uma espécie de cultura do hedonismo. Uma representação da fuga da dor e sofrimento ocasionado pela própria realidade da vida.

 Representação da pós-modernidade vem justamente com a proposta do fim das ilusões. Não há mais projetos futuros o que vale são os instantes. Esta concepção gera uma grande contradição de valores. Não há com a pós-modernidade a preocupação da sua trajetória, a condição vivida. O que importa é o hoje, estar no agora e o aqui presente que representa que sou. O que interessa é a imagem individual. As virtudes está no “Estar” e não no “Ser”. Seja na apresentação corporal, na sua representação como performance e a intensidade do viver. Uma forma compulsiva de existência. Uma incitação desenfreada, com propósitos duvidosos, de que se tem que fazer, ter, aparecer, para encontrar um sentido maior para viver. Talvez o mal-estar então esteja relacionado mais com a exposição pública, do que o outro vai pensar, do que com os próprios valores, as próprias virtudes. Não somos mais capazes de sermos interiorizados. A crença, dominou-se coletivamente, em torno do sucesso. Se não alcançar o sucesso, a admiração e a condição de ser visto, a insuficiência toma conta dos sentidos e então deprimimos, sofremos, angustiados das escolhas que não fizemos. A culpa se torna presente com a doença da autonomia. Não sofremos mais pelo que fizemos ou por aquilo que gostaríamos de ter feito, ou se fizemos mal ao outro, tanto faz. Hoje sofremos pelo simples fato de não ter feito. A crença está na desconstrução do próprio sujeito. O sofrimento moderno sofre pela incapacidade de fazer.

Eis então uma crença maior da contemporaneidade. A felicidade tornou-se uma condição única, individual, que depende exclusivamente de nós. Acredita-se hoje que não se pode esperar que o outro seja responsável por ela. Esta busca depende da sua forma única. Saber o que vai te fazer feliz é uma condição exclusivamente sua. O que representa a felicidade está na sua individualidade e isto é um grande equívoco.  Não que seja questão da contemporaneidade o desejo de ser feliz. Esta questão perpetua na vida humana desde seu surgimento. A muitos pensadores que considera a busca da felicidade o sentido único para se viver. Entretanto, com a pós modernidade as referências foram se transformando. Não são somente os seus desejos e propósitos, a sua relação com o mundo e os afetos que constituem sua vida. Fato é, não se é feliz só. A felicidade só existe na condição presente do outro com o outro. Entretanto, o inverso não é verdade. Em outras palavras, a felicidade só existe na conjuntura presente de outra pessoa, mas o sofrimento não. O sofrimento é individual.

Hoje a busca da felicidade de deturpou em uma busca individualista, egoísta e egocêntrica. Ultrapassou nossas questões introspectivas e tornaram uma razão pública, ocultada na condição do que o outro acha sobre nós e não mais a relação de nós com nós mesmos. Ou seja, não são mais nossas inspirações e expirações que nos tornam felizes, mas o que o outro espera de nós. Deixar de ser para ser o outro, aonde o outro representa uma condição imposta diante a desconstrução dos próprios valores humanos e morais.

A verdade é que felicidade não é uma busca individual, ela está relacionada com a nossa capacidade de se reconhecer, se relacionar e alimentar nossos afetos. Identificar em nós mesmo aquilo que nos pertence e que faça sentido para o instante compartilhado com alguém presente.

O problema é que não ser feliz hoje é sinal de incompetência, como se houvesse a destreza de que é possível ser feliz sempre, como se isto fizesse algum sentido. A infelicidade é com a pós-modernidade a representação de um sentimento de desqualificação, desvalorização da própria existência do ser, no verdadeiro sentido de fracasso. Em um mundo aonde as aparências representam mais do que essência, ter a imagem marcada pela infelicidade talvez seja mais doloroso do que o próprio sentido de ser infeliz.

Verdade é que nossas transformações foram acontecendo ao longo de nossa vida e está em nós o conhecimento e o sujeito de nossa própria soberania, como autônomo. Precisamos quebrar a crença destas condições imperativas.

Os excessos de possibilidades, a necessidade imperativa de ser feliz, responsabilidades pelas escolhas, medo, angustia, ansiedade, insegurança, cobrança, velocidade, reflexos desta sociedade no qual fazemos partes e a qual criamos. Será mesmo que queremos mudar?

 Encontrar razões para entender que só podemos nos tornam melhores aceitando as mudanças nos afligem ou geram desconforto e são difíceis de resignar. A resistência a mudança está na forma no qual ela está sendo proposta a ser feita. Só há medo, desconforto, aflição, quando não há propósito e nem clareza. Qualquer atitude ou comportamento contrário a ela tem muito mais a ver com a falta de transparência. A insegurança só existe quando não se tem claro os motivos para mudar. Sem motivos não há motivação. Resistir a mudanças é porque ela não faz sentido e aquilo que não faz sentido gera insegurança e com a insegurança deixará qualquer um numa posição defensiva. Portanto, sem propósito e sem clareza não há como ter sentido da razão de mudar. Tudo que não faz sentido nos contrária.

A mudança para ser aceita deve ser consciente e não imperativa. Deve ser construída, construtiva e objetiva, senão, não será uma mudança, mas sim, uma imposição. Toda imposição tende a fracassar! O imperativo gera medo, insegurança, desconforto, infelicidade e a sensação implícita de perda. Mudar, não significa perder, mas sim, ganhar.

Isto é tão certo quanto o equívoco daqueles que insistem em dizer que todo ganho gera perdas. Isto não é verdade! Assim como as mudanças, todo ganho gera ganho. Tudo é uma questão da perspectiva no qual se observa. Se as escolhas feitas efetivamente façam algum sentido para você. É a representação dos valores que você dá a sua própria vida. Perdas é quando temos a chance de conquistar algo melhor e não fazemos nada. É encontrar oportunidade de uma vida melhor, de um melhor bem-estar, dar um sentido maior para a vida, e não fazemos nada com isto! Ficar na zona de conforto, aceitar as coisas como estão, estagnar-se, retardar o próprio crescimento com desculpas, críticas e julgamentos são condições intrínsecas nos perdedores e são inaceitáveis a todo e qualquer ser humano que dá valor a vida. Não existe perdas quando alcançamos algo melhor, que faça mais sentido e nos traz mais alegria para viver. Perder e ganhar são questões da consciência, de saber o que é valor para a própria vida. Quando temos consciência que a perda é maior que o ganho, sentimos automaticamente o desejo de sair do estado presente e mudar.

Para saber dar valor só há um caminho a perseguir, a condição de perceber intrinsecamente a própria vida. E isto começa com a consciência da liberdade de viver. A liberdade é parte fundamental para a compreensão da mudança.  Está na liberdade possibilidade de viver presente. A liberdade nos permite pensar. O pensar gera consciência. Estar consciente é estar presente no agora. É condição de convicta aceitação da realidade; uma crença profunda, realçada por valores fortes que permitem então primeiro se aceitar e então dar a chance para experimentar a vida. São através das experiências que tomamos nosso mundo como realidade. Diante a realidade é que percebemos que somos contínuos. A condição de continuidade nos traz a clareza das transformações que sofremos a todo instante.

Claro que toda mudança é questão de escolha. Toda escolha gera angustia. Talvez seja isto então que representa o temos de mudar. Isto porque estamos diante a tantas escolhas que sentimos angustiamos não saber o que escolher. Aquilo que podemos chamar de vazio existencial. Ficamos tão plenos de possibilidades que acabamos por nos sentir vazios, impotentes diante a um mundo que não para de mudar. Não é o medo de mudar, mas de não saber então escolher.

Se a angustia nos acompanha, então é preciso saber dar valor para melhor escolher e assim diminuir a ânsia do viver. Valor para as próprias decisões. A consciência de que somos aquilo que escolhemos para nós. E todas as escolhas são decisões exclusivamente de nossa responsabilidade. Nossas escolhas, determinam a essência de nós mesmos. Está na condição de existência a questão que perpassa a nossa capacidade de julgar, e a questão que perpassa a nossa condição de agir são variáveis decisivas de nossa consciência humana. Por isto que mesmo que não haja todas as respostas, que então seja feita todas as perguntas para encontrar uma razão. Tudo aquilo que tem clareza e faz sentido, nos gera força suficiente para fazer da mudança uma alegria. Dar sentido a nossos passos é o poder de ser mais!

Dar sentido à vida é princípio básico para sobreviver! Indagar, questionar e perguntar, não aceitando a primeira, a segunda ou a terceira resposta. Quanto mais preciso formos com nossas perguntas melhor serão as possibilidades encontradas e mais sentido as mudanças terão para ser realizadas.

O que nos faz exclusivos no mundo é justamente a capacidade que temos para pensar. Reconhecer os próprios limites é parte do pensar. É através dos pensamentos que conseguimos transformar a existência em consciência e este caminho é o que nos possibilita encontrar possibilidades para não cair na tentação de viver a vida abstraindo da realidade com achismos porque este é mais simples para seguir. Interpretar sem conhecer é o mesmo que alucinar. Para viver a própria vida e não ser vítima do acaso, ter controle sobre as escolhas e não deixar com que a vida tome as decisões por nós. É preciso ser protagonista da própria história. Deixando para trás a nostalgia de não ter feito melhor. A pró-atividade nas ações com a vida nos permite aprimorar nossas próprias relações. 

A vida é uma obra aberta e a resiliência está presente naqueles que sempre encontra formas diferentes de ver a mesma situação e não resiste quando vê a necessidade de mudar. Resistir a mudanças nos mantém aprisionados aos problemas e nos oprime ao próprio mundo no qual vivemos.  Deixando a vontade de viver para então sobreviver! Nós vivemos um momento de lacunas e o pensamento emergem exatamente de incidentes das experiências que nós temos, e são eles que constituem nossa própria essência dos ser. Está na condição de sermos sempre, a capacidade de sermos melhores e sempre que permitimos mudar estamos dando a oportunidade a nós mesmos de ser construtores da própria história e não escravos do acaso ou daquilo que querem nos impor!

“O eu, é a única pessoa de quem não posso me separar, que não posso deixar, com quem eu estou eternamente conectado. Logo, é muito melhor estar em desacordo com os outros do que ser inimigo de mim mesmo. ”

Texto da minha palestra: Mudar é preciso, não mudar é sofrer!

REFERÊNCIAS E INSPIRAÇÃO

BAUMAN, Z. Cegueira Moral. Rio de Janeiro: Zahar, 2013.

BAUDRILLARD, J. A sociedade do consumo. – São Paulo: Edições 70; 2009.

DEBORD, G. A sociedade do espetáculo. São Paulo: Contraponto Editora; 1997.

HERZOG, R. O homem diante das transformações do mundo. CPFL: Café Filosófico. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=JAh8PqrnEeM>.

SAFATLE, V. Por um colapso do indivíduo e de seus afetos. CPFL: Café filosófico. Disponível em: < https://www.institutocpfl.org.br/2015/09/29/por-um-colapso-do-individuo-e-de-seus-afetos-com-vladimir-safatle-versao-na-integra/>.

Um comentário

  • Luciano Vieira

    Prezado Sr Marcello.
    Quero parabenizar pelo majestoso artigo “Mudar é preciso..”. Adorei o texto.
    Aceite meus singelos aplausos de um coração que busca sentido pra vida!