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O Amor Catálogo: Quando o Amor se Torna um Produto

“Amamos não pelo que encontramos no outro, mas pelo que somos capazes de reconhecer além das falhas — e aceitar que a beleza verdadeira nasce da imperfeição compartilhada.” – Marcello de Souza

Você não está procurando uma alma.
Está procurando um produto com especificações.

Vivemos a Era do Amor Catálogo — um fenômeno silencioso, mas profundo, que transforma corações em checklists e pessoas em conjuntos de atributos: “1,80m”, moreno, cabelos lisos e compridos, “viajante”, “sem bagagem emocional”.
Procuramos personagens que se encaixem em nossa biografia idealizada, não seres humanos dispostos a viver a verdade imperfeita de uma história real.
A busca pelo parceiro ideal se tornou, paradoxalmente, a maior barreira para encontrar um amor genuíno.

O Fenômeno e suas Raízes Filosóficas
Na filosofia existencial, autores como Kierkegaard e Sartre nos lembram que a liberdade e o encontro autêntico com o outro são experiências angustiantes, mas essenciais para a construção do sentido da vida.
A busca pelo “parceiro perfeito” é, na realidade, uma tentativa de escapar dessa angústia.
Ao transformarmos o amor em uma lista de atributos, nos protegemos da vulnerabilidade que um encontro genuíno exige — mas abrimos mão da experiência mais rica da existência: o encontro com o outro em sua totalidade, imperfeita e surpreendente.

Byung-Chul Han, em A Agonia do Eros, nos alerta sobre como a sociedade contemporânea transforma relações em consumo: “Procuramos parceiros como produtos, descartando o que não se encaixa na expectativa imediata”. O “O Amor Catálogo” é a expressão máxima desse comportamento: a ilusão de que podemos escolher o amor como se escolhemos uma mercadoria.

A Psicologia por Trás do Catálogo

Do ponto de vista psicológico, o “O Amor Catálogo” é alimentado por feridas emocionais profundas.
A projeção da perfeição é um mecanismo que protege o ego: acreditamos que, se encontrarmos a combinação exata de traços, seremos amados de forma segura, imune à rejeição ou à dor.

Psicólogos como John Bowlby, com sua teoria do apego, explicam que padrões inseguros de apego reforçam essa busca pelo parceiro ideal.
A ansiedade gerada pela incerteza do amor nos leva a catalogar, comparar e filtrar potenciais parceiros, evitando enfrentar o medo primordial: o de ser visto em nossa vulnerabilidade e ainda assim ser aceito.

Viktor Frankl, em Em Busca de Sentido, nos lembra que a felicidade e o amor genuíno só surgem quando nos tornamos capazes de assumir a responsabilidade por nossa própria existência.
O “O Amor Catálogo” é uma fuga dessa responsabilidade: buscamos um outro “perfeito” que nos dê a ilusão de completude, sem precisarmos nos confrontar com nossos próprios limites e fragilidades.

O Corpo e o Cérebro
A neurociência oferece outra camada de entendimento.
Nosso cérebro teme o desconhecido. A incerteza ativa a amígdala, região responsável pelo medo, desencadeando ansiedade.
Ao transformar o amor em um conjunto de critérios previsíveis, nosso sistema límbico se acalma — mas a paz é ilusória.

Antonio Damásio, em O Erro de Descartes, destaca que emoção e razão são inseparáveis: a escolha afetiva não é apenas cognitiva, mas profundamente corporal.
O “O Amor Catálogo” é um esforço consciente e inconsciente de racionalizar aquilo que, por essência, é irracional: o encontro emocional, vulnerável e imprevisível com outro ser humano.

O Encontro com o Defeito
Então, você encontra alguém.
Alguém que atende nove dos dez itens da lista.
Mas é justamente o décimo — o “defeito” inesperado, a risada que não combinava com seu roteiro, a opinião que desafia suas expectativas — que se torna o epicentro das suas insônias.

A relação não desaba pelo defeito em si, mas pelo olhar que o interpreta como falha.
O olhar do controlador que vê a vida como uma planilha, o amor como um contrato.
E assim, o que poderia ser conexão genuína é sacrificado no altar da especificação.

Winnicott nos lembra que maturidade emocional é a capacidade de suportar a frustração do outro ser separado de nós — de reconhecer e aceitar a autonomia do outro sem tentar moldá-lo.
O “O Amor Catálogo” falha porque espera que o outro seja um reflexo de nossas expectativas, e não um sujeito de sua própria vida.

Do Catálogo ao Espelho
E se a jornada não for encontrar a pessoa “certa”,
mas tornar-se alguém capaz de ver beleza na pessoa inesperada?

A cura começa quando trocamos o catálogo pelo espelho.
Pergunte-se:
— Que ferida estou tentando compensar com essa lista?
— Que medo da minha própria imperfeição estou projetando no outro?

O amor orgânico não nasce da compatibilidade perfeita de dois currículos,
mas da coragem de dois seres imperfeitos se escolherem, dia após dia,
para construir um território comum de ajustes, concessões e descobertas.

O ato de amar, portanto, torna-se um exercício constante de liberdade e responsabilidade — um treino diário de empatia, aceitação e vulnerabilidade.

O Amor como Paisagem
O amor de verdade não é um produto que você encontra.
É uma paisagem que você habita.
E as paisagens mais belas têm desníveis, pedras e horizontes imprevistos.

Destrua o catálogo.
A magia começa onde o controle termina.

O amor é o território que construímos com coragem, autenticidade e paciência.
É no encontro com o outro, com suas falhas e surpresas, que descobrimos a profundidade da vida, da conexão e do sentido.

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