
A Dor que Sentimos é a Narrativa que Construímos
“Você não é ferido pelo que os outros fazem, mas pela forma como você interpreta essas ações.” – Epicteto
A máxima do estoicismo não é um convite à passividade ou indiferença, mas uma profunda provocação à consciência crítica sobre o que carregamos internamente diante dos vínculos humanos. Em um universo onde as relações são o tecido que conecta sentidos, propósitos e existências, a forma como interpretamos as ações do outro é um ponto de virada entre saúde e sofrimento, entre liberdade e aprisionamento emocional.
A complexidade das relações saudáveis: além da superfície
Uma relação saudável não é a ausência de conflitos, nem a idealização romântica de harmonia contínua. Ela é um organismo vivo, dinâmico e complexo, que se sustenta pela integridade, pelo respeito mútuo e pela autonomia interdependente. O pensamento sistêmico nos ensina que todo elemento em uma rede influencia e é influenciado por outros, gerando padrões que transcendem o indivíduo.
Reflita: A dor emocional nasce menos da ação do outro e mais da narrativa que criamos sobre ela.
Nessa lógica, o que um parceiro pensa, sente e faz reverbera no outro e no sistema relacional como um todo. Quando uma interpretação é limitada, distorcida ou dominada por emoções reativas, cria-se um ciclo de retroalimentação negativa, em que sofrimento e desconfiança crescem em espiral, contaminando o vínculo.
Assim, uma relação saudável requer mais do que sentimentos positivos; demanda uma inteligência emocional expandida, capaz de reconhecer as próprias emoções e as do outro, de negociar significados e reconstruir interpretações.
O que não pode existir numa relação saudável: padrões tóxicos de interpretação e comportamento
Quando falamos de “não pode ter” em relações saudáveis, o foco deve estar em padrões destrutivos que comprometem a autonomia emocional e o respeito mútuo, tais como:
• Desvalorização do self: A relação que mina o autoconceito, que distorce a percepção que temos do nosso valor, envenena a base do vínculo. O neurocientista Daniel Siegel reforça a importância do “self integrado” para a saúde mental e relacional — quando a autoimagem é destruída, o sistema nervoso fica em estado de alerta, sabotando a intimidade.
• Interpretações absolutistas e distorcidas: A tendência a interpretar ações alheias como ataques pessoais cria defesas emocionais excessivas, que bloqueiam o diálogo e aumentam o desgaste afetivo. A Terapia Cognitivo-Comportamental mostra que esses “esquemas cognitivos” podem ser desafiados e ressignificados, mas sua permanência é altamente nociva.
• Controle e invasão de limites: Relações saudáveis requerem respeito à autonomia individual. A invasão constante, a tentativa de controle emocional e comportamental destrói a confiança e a autenticidade.
• Ausência de responsabilização: Evitar o confronto saudável, negar falhas próprias e projetar culpa no outro impedem o crescimento conjunto.
Reflita: Interpretar é um ato criativo – e podemos criar novas narrativas para nossas dores.
Esses elementos não são meros “defeitos” — são sintomas de interpretações falhas, carregadas de dores não trabalhadas e crenças limitantes. A dificuldade está em ressignificar esses padrões dentro da complexidade relacional, que exige consciência ampliada e compromisso mútuo.
3. Autocuidado e autoamor: os fundamentos da relação saudável
Um vínculo saudável nasce do encontro entre dois “eus” que se reconhecem como indivíduos integrais e autoconscientes. O autocuidado e o autoamor não são caprichos narcisistas, mas práticas fundamentais para garantir a integridade emocional.
Segundo Kristin Neff, referência em autocompaixão, o autoamor implica em reconhecer as próprias limitações e dores com gentileza e respeito, sem julgamentos severos. Neurocientificamente, essa postura ativa o sistema parassimpático, responsável pela regulação emocional e pelo bem-estar.
Além disso, o pensamento sistêmico reforça que só podemos contribuir para o sistema relacional quando estamos equilibrados internamente. A negligência do autocuidado produz “buracos” emocionais que são preenchidos com dependência, cobrança ou rejeição, comprometendo o vínculo.
Práticas comportamentais diárias, como estabelecer limites claros, exercícios de reforço positivo (ABA) para comportamentos saudáveis, e a busca ativa por sentidos pessoais, sustentam o autoamor e fortalecem a resiliência emocional.
Reflita: Nosso cérebro filtra a realidade, não a reproduz; essa filtragem determina nossa resposta emocional.
A liberdade da interpretação: um convite à transformação
Reconhecer que a dor provém da nossa interpretação das ações alheias é também reconhecer uma janela de liberdade: podemos aprender a interpretar de modo mais construtivo.
Isso não significa negar o sofrimento ou aceitar abusos, mas sim assumir o papel ativo na construção dos significados que damos ao que vivemos. Essa transformação é um dos pilares do desenvolvimento cognitivo comportamental, onde a consciência e a escolha substituem a reatividade.
A filosofia existencialista, especialmente Jean-Paul Sartre, nos lembra que somos “condenados à liberdade”: não podemos escolher as ações do outro, mas sempre temos o poder de escolher nossa resposta. Esse poder é o fundamento da maturidade emocional e do desenvolvimento humano.
Reflita: Mudar a interpretação é abrir espaço para a liberdade afetiva e relacional.
Por fim,
Relações saudáveis exigem uma aliança entre respeito, autonomia e uma interpretação consciente e empática do que o outro traz. A ausência dos padrões tóxicos mencionados é condição indispensável para que o vínculo floresça.
O caminho passa pela transformação interna, pela ampliação do autoamor e do autocuidado, e pela capacidade de reformular narrativas, reconhecendo que a forma como interpretamos define, em última análise, a qualidade das nossas relações e da nossa existência.
Fato é que a consciência crítica é a chave para romper padrões emocionais automáticos.
Se esse convite tocou você, reflita sobre sua postura interpretativa nas relações que vive e compartilhe sua experiência nos comentários. No blog, você encontrará uma análise mais aprofundada para apoiar sua jornada.
Saiba que estou aqui para acompanhá-lo(a) na complexa, mas libertadora, tarefa de construir relações genuínas e um self integrado.
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