
VOCÊ NÃO VIVEU MENOS TEMPO. SÓ SE AUSENTOU DELE
Um convite radical à presença: por que o fim de semana parece evaporar e como reencontrar a intensidade perdida?
É domingo à noite. Você está no sofá, o sol se despede no horizonte, e uma inquietação profunda emerge — não aquela simples passagem do tempo, mas uma sensação de ausência: “Onde foi parar meu fim de semana?” As 48 horas prometidas como um oásis de liberdade e renovação se dissolveram como areia fina entre os dedos, deixando um vazio que ecoa na alma.
Se essa experiência lhe é familiar, saiba que ela traduz um fenômeno universal, mas também singularmente subjetivo: o tempo, enquanto dimensão cronológica, permanece imutável. O que muda é a qualidade da nossa presença, o grau de coesão do nosso self com o agora. A ‘neurofenomenologia’ nos ensina que a mente fragmentada, dispersa entre passado e futuro, cria a ilusão de um tempo que “passou rápido” — quando, na verdade, fomos nós que nos ausentamos da vivência plena do presente.
Inspirado pelas pesquisas de David Eagleman, que desmistificam a linearidade do tempo e mostram que o cérebro grava momentos — não minutos — e pela filosofia narrativa de Paul Ricoeur, que nos vê como histórias em constante construção, este texto convida você a uma jornada transformadora. E se o problema não for o tempo que escapa, mas nossa habilidade de atravessá-lo com presença e intenção?
Aqui não há fórmulas mágicas de produtividade ou truques superficiais para “ganhar tempo”. Este é um chamado para uma imersão profunda na experiência do agora, para “hackear” a percepção temporal a partir de uma integração consciente entre mente, corpo e emoção.
Como Desenvolvedor Comportamental e sempre com uma visão sistêmica, enxergo o tempo como um palco vivo onde se desenrolam os atos da existência. Você pode escolher ser o ator presente e consciente, iluminando cada cena, ou permanecer na penumbra da distração e da alienação temporal.
Vamos começar essa transformação? Então, responda: Quando foi a última vez que você terminou um fim de semana sentindo que ele foi verdadeiramente vivido — não apenas passado?
O Tempo é uma Construção da Mente
Por que um fim de semana de 48 horas pode parecer evaporar em um piscar de olhos? A resposta não está na duração objetiva, mas na forma como o cérebro constrói a experiência do tempo. David Eagleman, um dos principais neurocientistas contemporâneos, esclarece que o cérebro não registra o tempo em minutos corridos, mas em fragmentos experienciados, moldados por três pilares fundamentais: novidade, emoção e atenção plena.
Quando nos submetemos a rotinas repetitivas — as mesmas tarefas, os mesmos trajetos, as mesmas conversas — o cérebro entra em um estado neurofuncional conhecido como “piloto automático”. Esse mecanismo, vital para a economia energética, reduz a atenção a detalhes e diminui o processamento no hipocampo, a região cerebral-chave para a formação de memórias episódicas. Consequentemente, esses momentos repetitivos geram poucos registros duradouros, fazendo com que o tempo subjetivo pareça encolher e escorrer por entre os dedos.
Imagine um domingo típico: horas passadas em telas, navegando em redes sociais, assistindo séries ou repetindo padrões habituais. Ao tentar relembrar o dia, ele se dissolve em uma névoa indistinta, quase como se não tivesse existido. Pesquisas em neuroplasticidade realizadas no Baylor College of Medicine demonstram que em contextos monótonos o hipocampo é menos ativado, interrompendo o processo de consolidação de memórias ricas e detalhadas.
Em contrapartida, experiências novas e emocionalmente significativas despertam intensamente o cérebro. Pense em um dia memorável — uma viagem inesperada, uma conversa profunda, ou uma conexão genuína que tocou sua essência. Nesses momentos, o cérebro, em estado de alerta ampliado, ativa circuitos do córtex pré-frontal e do sistema límbico, áreas essenciais para o processamento emocional e cognitivo. Um estudo do Journal of Neuroscience (2019) evidenciou que eventos com alto impacto emocional e novidade geram memórias densas e duradouras, criando a sensação subjetiva de um tempo estendido.
Claudia Hammond, psicóloga especialista em percepção temporal, sintetiza essa ideia com a máxima: “Recordamos momentos, não dias.” Um fim de semana que parece “curto” é, na verdade, um fim de semana vazio — vazio de presença, novidade e vida significativa.
Mas há esperança e, sobretudo, caminhos concretos para transformar essa percepção. Como especialista em desenvolvimento comportamental, minha proposta é clara: o segredo está em ativar o cérebro e o coração para construir um tempo vivido com densidade e significado, desafiando o piloto automático.
Quer ver na prática? Para isso convido você no próximo fim de semana, introduza uma pequena mudança consciente: caminhe por uma rua que você nunca percorreu, experimente um prato diferente, ou inicie uma conversa genuína com alguém inesperado. Gestos simples como esses ativam o córtex pré-frontal, elevam a liberação de dopamina e facilitam a neuroplasticidade, criando memórias que esticam o tempo.
Com meus clientes, sempre reforço que a conexão profunda com o presente não só nos faz viver o momento, mas realinha nossa narrativa pessoal com um propósito maior, criando pontes entre nossa história individual e o sistema maior ao qual pertencemos.
Por isso deixo aqui uma questão para você pensar:
Que pequena novidade você pode introduzir no seu próximo fim de semana para despertar sua mente e fazer o tempo ganhar densidade e significado?
O Solo Vivo da Identidade
A memória não é apenas um arquivo do passado; é o alicerce dinâmico onde construímos quem somos. Paul Ricoeur, em sua obra Tempo e Narrativa, propõe que nossa identidade é uma história contínua, tecida a partir das experiências que escolhemos registrar e recontar. Cada momento vivido, por mais fugaz que pareça, é um fio que entrelaça o tecido do nosso self. Mas por que, então, tantos fins de semana se dissolvem em um borrão, como capítulos em branco na nossa autobiografia?
A neurociência oferece uma resposta. Antonio Damásio, em O Erro de Descartes, explica que a memória e a identidade estão entrelaçadas por meio da integração entre emoção e consciência. O cérebro registra estados corporais e emocionais, criando um mapa dinâmico que dá coerência à nossa existência. Endel Tulving, referência em memória episódica, complementa: diferente da memória semântica (fatos gerais), a memória episódica armazena eventos específicos, carregados de sensações, emoções e contexto pessoal. É ela que nos permite “viajar no tempo mental”, revisitando momentos que definem quem somos.
Um estudo publicado na Nature Reviews Neuroscience (2020) reforça que o hipocampo e o córtex pré-frontal, regiões centrais para a memória episódica, são ativados com mais intensidade em experiências emocionalmente significativas. Um olhar demorado para o pôr do sol, uma conversa que toca a alma ou o sabor de um prato que remete à infância: esses instantes, por menores que sejam, criam memórias densas que fortalecem nossa narrativa pessoal. Por outro lado, um fim de semana preso ao piloto automático — navegando nas redes sociais ou repetindo rotinas — não deixa pegadas no hipocampo, tornando-se um vazio narrativo. Não por acaso que um fim de semana vivido com atenção plena e emoção não é apenas um evento isolado — é um capítulo que ressoa com nossa história mais profunda, fortalecendo o senso de propósito e pertencimento.
Por isso deixo aqui uma questão para você pensar:
Quando você olha para trás, quais memórias de fins de semana realmente importam? O que elas dizem sobre quem você é?
E Se Você Estiver Passando Reto Pela Vida?
Essa reflexão pode incomodar, mas é fundamental. O tempo é imutável — 48 horas são sempre 48 horas. O que varia é a qualidade com que as preenchemos. Hannah Arendt, em A Condição Humana, lembra que a vida se realiza pela ação — escolhas conscientes que nos lançam ao mundo e nos fazem existir de forma plena. Passar reto pela vida é imergir no que chamo de “vácuo existencial”: um estado de desconexão em que as horas se desfazem em rotinas automáticas, vazias de sentido e presença.
Na psicologia, esse fenômeno é conhecido como mindlessness — ausência de atenção e intenção. Ellen Langer, pioneira do conceito, demonstra que esse estado reduz a ativação do córtex pré-frontal, e como já dito, dificultando a formação de memórias significativas e comprimindo nossa experiência subjetiva do tempo. Um fim de semana consumido por hábitos repetitivos ou distrações digitais é como um livro folheado sem leitura — as páginas passam, mas nada permanece.
Como romper esse ciclo? A resposta reside em ações conscientes que realinham mente, corpo e emoção ao agora. Minha prática em Desenvolvimento Cognitivo Comportamental (DCC), entende a presença como um ato de coragem — uma decisão deliberada de habitar cada instante com plena intenção. Reconhecida a dimensão da desconexão, avançamos para a parte mais empoderadora: a capacidade de moldar intencionalmente nossa percepção temporal. O tempo cronológico é fixo, mas o tempo vivido é maleável e depende da profundidade da nossa atenção e consciência.
Neurociência, psicologia comportamental e filosofia convergem em um princípio fundamental: a atenção plena aliada a escolhas intencionais é o “hack” mais eficaz para criar memórias densas e ampliar a sensação do tempo.
Por isso, a seguir, proponho nove estratégias integrativas — que transcendem a produtividade — para fazer dos seus fins de semana capítulos ricos e inesquecíveis da sua história pessoal:
1. Explore um lugar novo: Não é preciso grandes aventuras. Uma rua pouco conhecida, uma livraria diferente, um café com vista singular despertam a curiosidade e ativam o sistema límbico, liberando hormônios que ampliam a percepção temporal.
2. Reconecte-se com o outro: Uma conversa genuína — seja com um amigo antigo ou um desconhecido — gera memórias emocionais profundas. Estudos indicam que interações sociais significativas aumentam o sentimento de pertencimento e prolongam a sensação temporal.
3. Resgate memórias afetivas: Cozinhar um prato da infância ou ouvir uma música marcante ativa circuitos de memória afetiva. Na Constelação Psicossistêmica, esses gestos funcionam como pontes para o sistema psicofamiliar, fortalecendo a narrativa pessoal.
4. Contemple a natureza: Observar o céu, caminhar entre o verde ou sentir a brisa reduz o estresse e intensifica a presença. Psicologia ambiental confirma que esses momentos promovem sensação de transcendência, onde o tempo parece ganhar densidade.
5. Desafie a repetição: Pequenas mudanças conscientes no cotidiano ativam o córtex pré-frontal, responsável por processar novidades e consolidar memórias. Alterar o trajeto da caminhada ou experimentar uma nova atividade rompe o piloto automático, ampliando a experiência temporal.
6. Aposte em experiências emocionais: Emoções intensas catalisam a formação de memórias profundas. Alegrias, surpresas e até tristezas deixam pegadas neurais que prolongam o tempo vivido. Planeje momentos que toquem seu coração — um diálogo sincero, uma obra de arte, uma visita significativa — fortalecendo sua narrativa pessoal.
7. Pratique o Duplo Mindfulness: Minha abordagem exclusiva integra a atenção às sensações corporais com a consciência dos pensamentos, gerando uma presença profunda e integrada. Estudos mostram que essa prática sincroniza redes neurais, enriquecendo o tempo vivido. Durante uma refeição, por exemplo, esteja atento simultaneamente ao sabor e às sensações do corpo.
8. Antecipe com entusiasmo: A expectativa prazerosa é uma ferramenta neuroquímica poderosa. A antecipação positiva libera dopamina, preparando o cérebro para experiências mais vívidas. Planeje algo que lhe traga entusiasmo e permita-se saborear essa “pré-vivência” consciente.
9. Experimente ser principiante: O cérebro se renova com o novo. Aprender algo pela primeira vez ativa redes neurais ligadas à atenção e aprendizado, criando memórias densas. Ao adotar a mentalidade do aprendiz — tocando um instrumento, dançando ou cozinhando — você resgata o frescor das “primeiras vezes” e amplia seu repertório existencial.
Essas práticas simples, porém, poderosas, interrompem o ciclo da desconexão e alinham sua experiência com sua essência mais autêntica. São gestos que honram sua história e cultivam uma narrativa que ressoa com seu propósito.
Um fim de semana vivido com presença não é mero intervalo no calendário — é um ato criativo de construção de si.
Vamos pensar: O que, em sua rotina, impede que você habite o presente? Qual pequeno passo pode transformar seu próximo fim de semana numa memória que ecoe com sua essência?
O Poder da Presença
Presença não é mero conceito ou prática; é um estado ontológico, a base silenciosa a partir da qual toda a vida se desdobra. Não é o tempo que nos escapa nos fins de semana — ou na vida —, mas a nossa capacidade de habitar o instante presente com atenção radical, intencionalidade lúcida e profundidade afetiva.
Pesquisas recentes de Richard Davidson (Nature Neuroscience, 2022) demonstram que a presença plena sincroniza redes neurais entre o córtex pré-frontal — centro da atenção executiva e da regulação emocional — e o sistema límbico, núcleo da experiência afetiva. Quando essas regiões entram em harmonia, a experiência deixa de ser efêmera e para ser sentida: o tempo psicológico se expande, e as memórias tornam-se densas, carregadas de significado, como se a vida ganhasse mais “espessura”.
Mas presença não é apenas um fenômeno cerebral. É também um ato de coragem existencial diante da angústia do “tempo perdido”. Mário Quintana, com sua precisão poética, nos provoca: “O tempo não para, mas a gente pode parar no tempo.” Parar no tempo é um gesto de soberania interior: declarar que o agora é mais importante que a pressa, que a qualidade da experiência vale mais que a contagem das horas.
A filosofia existencialista, especialmente em Heidegger, reforça essa visão ao falar do “ser-no-tempo” (Dasein). Viver plenamente requer consciência da finitude, pois só a percepção da impermanência nos impele a saborear a singularidade de cada instante. Estar presente é resistir à alienação do ser, é dizer “sim” ao milagre de existir.
Sob a lente da constelação psicossistêmica, a presença cria uma ponte viva entre o indivíduo e os múltiplos sistemas de pertença — familiar, social, cultural, profissional. Um instante vivido com consciência não é apenas um ponto no agora: é uma vibração que ecoa no passado, molda o futuro e fortalece a narrativa que sustenta nossa identidade.
Exercício profundo de presença sistêmica
Na próxima pausa do seu fim de semana, crie um ritual: feche os olhos, respire fundo e pergunte-se — com absoluta sinceridade —:
“O que este momento está me convidando a honrar na minha história?”
Permita que o corpo fale antes da mente: sinta as reações físicas, perceba as imagens interiores, reconheça as emoções que emergem. Acolha tudo sem julgamento. Reconheça que esse instante não é isolado; ele está entrelaçado à sua família, à sua vocação, ao seu propósito de vida.
Esse gesto não é introspecção banal — é um ato de reconciliação consigo mesmo e com a rede invisível que o sustenta. É assim que se criam memórias que não apenas ocupam espaço no tempo, mas que o transformam em eternidade vivida.
O Tempo Não é o Inimigo, a Ausência É
Não se trata de “esticar” o tempo como se fosse um recurso a ser manipulado, mas de transformar a qualidade do nosso existir no tempo. A ausência que assola nossos fins de semana não é um fenômeno externo, mas um vazio interior, uma desconexão com o fluxo vivo da experiência — uma alienação do próprio ser.
A psicologia comportamental nos ensina que nossos hábitos e padrões mentais moldam o modo como o cérebro responde ao mundo. A ausência de presença é uma consequência de um condicionamento à dispersão, ao piloto automático. Mas a neuroplasticidade, essa incrível capacidade do cérebro de se reconfigurar, nos oferece a esperança concreta de transformação: com práticas intencionais, podemos reprogramar nosso “sistema operativo interno” para habitar o momento com mais atenção, autenticidade e profundidade.
Porém, a transformação mais profunda ocorre quando a consciência da finitude toca o âmago do ser — como Heidegger tão magistralmente ensinou, o “ser-no-tempo” é a condição para sermos humanos, e essa temporalidade não é um fardo, mas o portal para a liberdade existencial. Ao reconhecer que cada instante é singular e irrepetível, rompemos com a ilusão da eternidade automática e abraçamos o milagre do agora.
Nesse sentido, a presença não é um estado passivo, mas uma ação radical: um ato de coragem que afirma a vida contra a sombra da alienação e do vazio existencial. É um gesto de resistência ao vazio, uma revolução silenciosa que começa com um olhar consciente, uma respiração profunda, uma escuta verdadeira de si e do outro.
O “Duplo Mindfulness” que proponho é um convite para essa revolução interior, uma prática que não apenas amplia a percepção do tempo, mas nos reconecta à nossa essência e à trama viva das relações que nos sustentam.
E aqui reside o chamado mais profundo: não é apenas para que você viva seu fim de semana — é para que você viva sua vida. Que memória você deseja que seu “eu do futuro” carregue? Que presença você quer cultivar para que seu existir não seja um eco vazio, mas uma sinfonia vibrante de sentido e autenticidade?
Pois a verdadeira eternidade não está no relógio, mas na intensidade do ser que habita cada instante.
Não se esqueça: O tempo passa, mas a presença deixa pegadas eternas. Neste fim de semana, que momento você escolherá para que seu “eu do futuro” olhe para trás e sinta: eu vivi, e vivi por inteiro?
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O TEMPO NÃO PARA, MAS PODEMOS DANÇAR COM ELE
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